Tanto o excesso de mimo de mulher na criação dos meninos e
até dos mulatinhos, como o extremo oposto – a liberdade para os meninos brancos
cedo vadiarem com os moleques safados na bagaceira, deflorarem negrinhas,
emprenharem escravas, abusarem de animais – constituíram vícios de educação,
talvez inseparáveis do regime de economia escravocrata, dentro do qual se
formou o Brasil. Vícios de educação que explicam melhor do que o clima, e
incomparavelmente melhor que os duvidosos efeitos da miscigenação sobre o
sistema do mestiço, a precoce iniciação do menino brasileiro na vida erótica.
Não negamos de toda a ação do clima: também na zona sertaneja do Brasil – zona livre
da influência direta da escravidão, da negra, da mulata – o menino é um
antecipado sexual. Cedo se entrega ao abuso dos animais. A melancia e o
mandacaru fazem parte da etnografia do vício sexual sertanejo. A virgindade que
ele conserva é a de mulher. E nisto tem consistido sua superioridade tremenda
sobre o menino de engenho.
Certas tendências do caráter do sertanejo puxando para o
ascetismo; alguma coisa de desconfiado nos seus modos e atitude; o ar de
seminarista que guarda a vida inteira; sua extraordinária resistência física;
seu corpo anguloso de Dom Quixote, em contraste com as formas mais arredondas e
macias dos brejeiros e dos indivíduos do litoral; sua quase pureza de sangue –
são traços que se ligam da maneira mais íntima ao fato do sertanejo em geral, e
particularmente nas zonas mais isoladas das capitais e das feiras de gado, só
conhecer mulher tarde; e quase sempre pelo casamento. Gustavo Barroso, em
estudo sobre as populações sertanejas no Nordeste, diz serem comuns, no sertão,
rapazes de mais de vinte anos ainda virgens. O que, no brejo e no litoral,
seria motivo para debiques e troças ferozes. Sente-se aí o resultado da
influência direta da escravidão sobre estas duas zonas; e apenas indireta e
remota sobre o sertão.
(Gilberto Freyre, Casa-Grande
& Senzala, Global Editora, 51ª
edição, p. 459-460)
[ver Gustavo Barroso, Terra
de Sol, Rio de Janeiro, 1913]
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