quarta-feira, 26 de setembro de 2012
Comentário sobre os últimos comentários
Puxa, como isto bole na gente! A discussão aqui é das melhores e o que vocês me disseram deram um belo nó, cujo processo de fazer e desfazer pode ser o agrado de anos. Penélope nos ensinou desde as bases do pensamento ocidental como deveríamos proceder com as questões mais elementares e qual a paciência de reflexão tomaríamos ao tecer panos inacabáveis, ainda que inúmeros aspirantes - as opiniões - exigissem uma solução imediata. Se podemos crer que um conceito verdadeiro possa vir qual Ulisses em seu regresso, de espada em punho, talvez valha a pena a pergunta por qual tipo de "heroi" e qual tipo de "verdade" desejaríamos: uma definitiva, de reino perpétuo, ou uma que permitisse outros tecelões e outros regressos?
O problema de muitas religiões, tal como se apresenta e do modo como alguns as vivenciam, é a escolha pelo primeiro Ulisses, pois pelo preceito básico de que a própria crença se vincula a um ponto universal, logo aqueles que estiverem fora dela estão equivocados, uma vez que participam do universo envolvido. O toque para o que vem, seja aos religiosos ou não-religiosos, seja a qualquer vínculo que trapaceie com as diferenças (foi o meu caso com a matéria do jornal), é um tipo de Ulisses que não exclua, tampouco inclua, mas possibilite. O que eu achei ótimo no comentário de Reinofy foi isto: talvez as religiões precisem agora de mais ateísmo, sim, muito ateísmo, para deixar Deus livre para todos.
domingo, 23 de setembro de 2012
"Salvador é a 3ª capital com mais pessoas sem religião"
O objetivo da resposta a seguir é desarmar uma espécie de argumentação, sem defender qualquer conteúdo apresentado. O grande problema está na forma e nas consequências.
A matéria de capa do Jornal A Tarde de hoje, assinada por Luana Almeida, traz o último censo do IBGE sobre as escolhas religiosas dos baianos. Os católicos permanecem em primeiro lugar, os evangélicos quase duplicam as suas estatísticas, os espíritas também crescem e os adeptos do candomblé passam enfim a se revelar mais. O que mais chamou a atenção para a reportagem, no entanto, e inclusive é a manchete, foi o aumento do número de pessoas que se declaram "sem religião", que torna Salvador a 3ª capital com mais gente pautada nesta escolha. A fim de interpretar e exemplificar tais dados, houve três recortes: 1) declarações do antropólogo Ordep Serra; 2) declarações do antropólogo Jocélio Teles dos Santos; 3) o caso de uma jornalista que se declara sem religião e é casada com um evangélico.
No primeiro ponto, com a leitura de Serra, foram aspeadas as seguintes frases: "Vivemos hoje em um país mais livre, mas existem casos de perseguição religiosa. Muitas pessoas ainda escondem, ou por timidez ou por medo de iniciarem uma discussão a respeito" e "Muitos não querem o compromisso de fidelidade a uma crença". No segundo ponto, foi destacado o seguinte depoimento do Prof. Jocélio: "Considero um fenômeno da modernidade. Atualmente, pode-se assistir a uma missa, frequentar um terreiro de candomblé, ir a um ritual de umbanda, conhecer um culto na Igreja Evangélica, sem estar vinculado a nenhuma destas religiões, sem ser obrigado a segui-las pelo resto da vida". Viu-se como prova de tal análise o caso de uma jornalista de origem católica, casada com um evangélico, que não optou por nenhuma religião em especial. "Hoje, afirma que está conhecendo um pouco mais do espiritismo, mas ainda não tem uma definição concreta se irá seguir a doutrina", conforme se escreve na reportagem.
Nos três casos, as escolhas interpretativas seguem que o soteropolitano ou ainda teme o preconceito histórico de afirmar determinada religião ou é reflexo de uma tendência contemporânea em passear por vários eixos espirituais ou ainda está indeciso. Assim, estar "sem uma religião" é ainda um movimento que pressupõe a adoção religiosa, seja por temor, por infidelidade ou por projeto. Em nenhum momento se imagina que os 17, 6% que se declaram sem opção espiritual podem não querer e não pretender batismo algum, isto é, são céticos, ateus e agnósticos por princípio (as noções não são utilizadas em nenhum momento do texto). Além das premissas serem problemáticas, pois traz o elemento do preconceito quando se mostra ao mesmo tempo que os adeptos do candomblé, por exemplo, triplicaram, e a questão da dispersão contemporânea, quando já somos a capital do sincretismo há mais de 300 anos, apresenta-se na matéria uma conclusão falsa, e pior, oculta, de que o homem tende natural e essencialmente para algum destino universal, no caso, a religião, e de que o "voto nulo", por assim dizer, para a espiritualidade não é de fato uma escolha.
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